Paulistana, formada em Ciências Sociais na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, Marta Gil é especialista em comunicação e disseminação da informação na área da inclusão de pessoas com deficiência, especialmente em temas como Educação e Trabalho.
Com realizações relevantes sobre os tipos de deficiência no Brasil, ela defende a Informação, a Comunicação, a legislação e as políticas públicas como ferramentas fundamentais para promover a Inclusão. Mas não fazia ideia de onde chegaria quando iniciou a caminhada, em 1976.
“Fui voluntária até 1982, quando coordenei uma pesquisa nacional sobre o perfil sociológico de pessoas com deficiência visual (cegueira e baixa visão). Foram entrevistadas mais de 6.000 pessoas em 9 Estados brasileiros, com apoio da Fundação Projeto Rondon”, recordou.
Com prêmios, menções honrosas e cursos internacionais, entre 2004 e 2007 trabalhou com o tema HIV/Aids e Pessoas com Deficiência, com parte da equipe de Desenvolvimento Inclusivo do Banco Mundial.
Atualmente é consultora para empresas e órgãos públicos, palestrante em encontros nacionais e internacionais. Tem livros e artigos publicados em diversos formatos e veículos, além produzir conteúdo em vídeos e cursos de educação à distância.
Do voluntariado ao profissionalismo
Em 1989, foi uma das fundadoras do Amankay Instituto de Estudos e Pesquisas, hoje sob sua coordenação executiva. Em 1990, foi selecionada Empreendedora Social pela Ashoka – organização internacional sem fins lucrativos –, pela autoria da REINTEGRA, primeira rede de informações sobre os tipos de deficiência. Projeto ousado e inédito oficializado pelo Amankay em parceria com a USP, inaugurou uma área temática nas universidades do País.
Construindo pontes entre demandas da sociedade e o conhecimento, a Reintegra envolvia associações de pessoas com deficiência e familiares, órgãos governamentais, formadores de opinião, formuladores de políticas públicas, Universidades, etc. e funcionava em mão dupla: os usuários enviavam informações, alimentando o site e também recebendo respostas.
Por atender à demanda reprimida em uma época que o telefone fixo, cartas, fax e consultas presenciais ao acervo bibliográfico eram os meios de comunicação, a Reintegra cresceu e deu origem à Rede SACI – Solidariedade, Apoio, Comunicação e Informação, em 1999. A ampliação dos serviços contou com importantes parcerias: a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Rede Nacional de Pesquisa (RNP), que responde pela gestão da Internet no Brasil.
Uma ação afirmativa ainda necessária
Uma recente publicação que resultou de sua coordenação, é o guia on-line “Incluir: o que é, como e por que fazer?”, que orienta empresas na inclusão de profissionais com deficiência no mercado formal de trabalho. O Guia foi lançado em outubro de 2021, pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o Ministério Público do Trabalho (MPT), é gratuito e com um grande diferencial: segue os padrões internacionais de acessibilidade digital.
“Adotamos rigorosos procedimentos, utilizando o padrão WCAG 2.1, no nível de conformidade AA, desde a concepção gráfica. A observância deste padrão garante que pessoas com deficiência visual ou outras condições acessem o conteúdo com autonomia. A acessibilidade digital foi verificada por analistas que enxergam e com deficiência visual. O nível de qualidade alcançado é bastante alto”, explicou a Empreendedora Social.
A socióloga destaca a importância da acessibilidade dessas ferramentas: “Elas possibilitam que qualquer pessoa, independentemente de uma deficiência, tenha acesso às informações do guia, entenda seu conteúdo, e com isso, compartilhamos mais conhecimentos sobre a inclusão de pessoas com deficiência no mundo do trabalho”.
Com informações atualizadas sobre a empregabilidade de pessoas com deficiência e reabilitadas pelo INSS, a publicação on-line tem como ponto de partida a Lei de Cotas (Lei nº 8.213/1991). “Essa lei é uma ação afirmativa necessária, que já garantiu a inclusão de quase 500 mil pessoas com deficiência no mercado de trabalho, com todos os direitos trabalhistas assegurados”, ponderou.
Educação, trabalho e representatividade
Com projeção positiva, Marta identifica avanços na causa das pessoas com deficiência: “A legislação, principalmente a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e a Lei Brasileira de Inclusão (Lei Nº 13.146/2015) e o aumento da participação das próprias pessoas com deficiência, que foi muito significativa na eleição de 2018: muitas pessoas com todos os tipos de deficiência, em cidades de todos os tamanhos e em muitos Estados brasileiros se candidataram.”
Outro exemplo do positivismo das adversidades é a Política Nacional de Educação Especial (Decreto 10.502): “A Audiência Pública que discutiu esse serviu para mostrar sua inconstitucionalidade. Ele já foi suspenso, já houve intensas manifestações, da sociedade civil organizada e de instâncias políticas contra o decreto e o ministro já pediu desculpas.”
Para falar da importância do País se adequar ao tratado da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência da ONU, incorporado à Constituição Federal, ela lembra de um ponto que pouco se discute sobre a LBI: o Protocolo Facultativo.
“Quando uma Lei é bem fundamentada, logo de início ela apresenta seus pontos mais importantes. E o Art. 1º da Lei Brasileira de Inclusão diz que ela tem como base a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, ratificados pelo Congresso Nacional”.
Juntos pela Inclusão: Pessoas com e sem deficiência
Atenta à crescente visibilidade e presença de influencers com deficiência nas redes sociais, assim como ao aumento de matrículas em todos os níveis de ensino, do pré-escolar ao universitário e pós universitário, Marta elenca os principais desafios da atualidade:
- Mudar a representação social que a sociedade tem em relação às pessoas com deficiência, que se expressa no capacitismo;
- Ampliar a presença e a participação na sociedade, como galgar postos mais altos na hierarquia nas empresas ou em outros lugares na sociedade;
- Investir no desenvolvimento de suas habilidades e talentos.
“Nunca é demais repetir: A inclusão é um processo gradual que precisa ser alimentado constantemente, ser discutido e gerar reflexões. O mesmo vale para a mudança de valores e de visão do mundo, pois a Humanidade tem muita dificuldade para interagir com o Diferente – seja em termos de cor da pele, religião, presença de deficiência ou outra condição”, reconhece.
Para explicar a importância da aliança entre pessoas com e sem deficiência, a socióloga cita que a melhor resposta é do Especialista em Diversidade, Equidade e Inclusão Guilherme Gobato: