Foto: acervo pessoal. Créditos: Gustavo Schumacher
Por Elsa Villon
Ao iniciar o curso de Educação Física na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o gaúcho Gustavo Schumacher não imaginava que se tornaria treinador de uma equipe de judô paralímpico.
Atualmente, ele é personal trainner e doutorando pelo programa de pós-graduação em Ciências do Movimento Humano pela UFRGS, onde também possui mestrado. Mas sua história com o judô começou em 2001, no início da graduação: “Eu entrei para um projeto de extensão universitária, que ocorre dentro da universidade, voltado ao judô. O Projeto Bugre Lucena é um dos mais longevos da faculdade, com mais de 30 anos de atuação, de maneira ininterrupta”.
A inclusão de pessoas com deficiência ocorre em 2005, quando a iniciativa passa a atender pessoas com deficiência visual, mas de maneira segregada. Gustavo conta que os responsáveis acreditavam que essa era a melhor forma de atender os diferentes públicos. “Nós não aprendemos na faculdade como lidar com as necessidades das pessoas com deficiência dentro do esporte de maneira geral. Isso vem na prática do dia a dia, com as demandas que vão surgindo”, destaca.
Com o tempo, foi decidido misturar as turmas para que treinassem juntas e, em 2015, o personal trainner se gradua como faixa preta de judô e passa a assumir o comando da equipe de judô paralímpico da Associação de Cegos do Rio Grande do Sul (ACERGS), em parceria com a UFRGS.
Os desafios no desporto paralímpico
Gustavo assume a turma após ganhar uma bolsa da universidade para treinar a equipe, mas também pelo desafio e pensando na projeção profissional: “Quando você assume uma equipe de competição, você começa a almejar coisas maiores”.
Uma das questões que surgiram logo no início foi o capacitismo, pois, para o educador físico, a superproteção aos alunos com deficiência era algo injusto. Por isso, ele determinou que, dentro do tatame, todos treinariam de maneira igual.
Outro ponto importante percebido por Gustavo foi a gestão do esporte. Ao começar a participar de competições nacionais e internacionais e conviver com mais pessoas com deficiência, ele decidiu focar o seu mestrado e doutorado ao tema.
O desconhecimento sobre a deficiência também é um fator que dificulta a prática do desporto paralímpico de acordo com Gustavo: “Nós não sabemos como é a vida de uma pessoa com deficiência. Quando nós começamos a tentar sermos empáticos, nos assombramos com a quantidade de possibilidades que essas pessoas têm, algo que jamais imaginaríamos”.
Ele menciona que o preparo para treinar pessoas com deficiência é maior. É necessária mais empatia para a troca de experiências e para entender a realidade de cada um, e se adaptar a esse contexto. “As pessoas têm medo de lidar com a pessoa com deficiência e se acomodam em não querer aprender mais. Pensam que é melhor não atender uma pessoa com deficiência, porque demanda mais envolvimento e estudo”, afirma.
As conquistas ao longo dos anos
Apesar de se considerar extremamente competitivo, Gustavo defende que a principal conquista é transformar as pessoas em cidadãos por meio do esporte, graças à autonomia e independência que faz com que as pessoas com deficiência pertençam à sociedade.
Ele destaca que existe um número grande de pessoas com deficiência no Brasil, mas que elas não são vistas com regularidade nas ruas. Com o projeto, o personal trainner acredita que, vagarosamente, eles estão trazendo visibilidade para essa população, colocando-as não somente na rua, mas na universidade: “Os meus futuros colegas estudantes de educação física veem as pessoas com deficiência visual chegando aos treinos, as dificuldades e as virtudes deles dentro do tatame”.
Atualmente, os treinos são destinados a homens, mulheres e crianças, a partir de 11 anos de idade, sem distinções: “Nós acreditamos que o esporte faz bem para qualquer pessoa, inclusive pessoas com deficiência, nós aceitamos todo mundo. Se conseguir subir no tatame, nós vamos dar aulas”.
Um dos exemplos mencionados por ele é o judoca e campeão paralímpico Antonio Tenório, seis vezes medalhista de judô nos Jogos Paralímpicos, que continua ativo aos 51 anos. “No esporte paralímpico existe uma grande amplitude de idade, principalmente porque há poucos atletas, então a carreira costuma ser extensa”, pontua.
Gustavo afirma que muitos atletas têm conseguido bons resultados e conquistado medalhas, como Thiego Marques e Alana Maldonado, que foi campeã mundial. Ele também destaca a presença feminina no judô, com as judocas Meg Emmerich, Rebeca Souza e a própria Alana.
O papel das escolas na prática do esporte
O treinador acredita que é preciso investir mais no esporte para as pessoas com deficiência, de maneira inclusiva, mas também de alto nível, para que possamos, no futuro, ter atletas de alto nível.
A falta de dados sobre a deficiência e o número de pessoas com deficiência visual matriculadas nas escolas são fatores que impedem o avanço do desporto paralímpico ainda na fase escolar, de acordo com ele: “Aparentemente, existe um grande número de pessoas com deficiência visual que não vão à escola”, menciona.
Além disso, é importante saber quais escolas possuem estudantes com deficiência visual, quantos são e como é possível chegar até eles para apresentar o esporte. As associações também são uma questão, já que costumam ser, de maneira geral, geridas de maneira voluntária e com baixo número de participantes.
“As associações não têm estrutura para ir atrás das escolas, para ir atrás dos estudantes e trazê-los para o esporte. O desenvolvimento é todo problemático: temos o problema nas escolas, nas associações, e daí fica complicado chegarmos a esses atletas. Uma das maiores questões são os recursos humanos dentro disso”, finaliza.