Foto: acervo pessoal. Créditos: Renato Frosch.
Imagine passear de bicicleta pela cidade de Santos, em São Paulo, passando por monumentos históricos e conhecendo um pouco mais sobre a história de cada um deles. E, junto a isso, poder tocar réplicas táteis em miniatura desses monumentos, criadas em 3d para essa excursão. Assim é o “Santos às Cegas”, projeto criado pelo professor universitário Renato Frosch.
Especialista em desenvolvimento 3d, Renato já fazia miniaturas há alguns anos, quando em 2018 viajou para a Argentina em um laboratório. Em seu grupo de trabalho, havia uma participante cega e foi quando ele percebeu a oportunidade. O primeiro monumento criado foi da cidade Rosário, na Argentina, focado na acessibilidade para pessoas com deficiência visual. “Quando eu voltei para o Brasil, comecei a fazer os monumentos de modo espontâneo para dar acesso às pessoas e fazer em impressão 3d. Aí que eu chego ao Santos às Cegas”, conta.
A ideia cresceu e virou um projeto, inscrito em um edital promovido pela Secretaria de Cultura de Santos, na virada de 2020 para 2021. A proposta contempla uma bicicleta dupla, onde Renato leva pessoas para passeios pelos pontos da cidade onde estão os monumentos originais. Já no local, apresenta a miniatura tátil para que a pessoa, com ou sem deficiência, conheça mais sobre o contexto histórico de maneira lúdica.
O edital, com duração de dois meses, acabou sendo prorrogado e hoje é um projeto vinculado à Coordenação de Defesa de Políticas Públicas para Pessoas com Deficiência (CODEP) da Prefeitura de Santos. As visitas podem ser feitas às terças, no período da tarde, às quartas, no período da manhã, além de fins de semana, com agendamento prévio. De acordo com Renato, cerca de 100 pessoas participaram do passeio, sendo 30% a 35% delas com deficiência.
Projetos durante a pandemia
Além do “Santos às Cegas”, Renato é professor universitário na Faculdade São Judas, em Santos e em São Paulo. Formado em edificações, com mestrado na engenharia e doutorado em educação, seu trabalho é focado no desenvolvimento de recursos pedagógicos acessíveis. “É importante destacar que, quando digo inclusivos, é a essência da palavra inclusão, ou seja, que este material atenda ao maior número de pessoas possível”, pontua.
Para o professor, o grande ponto dos materiais inclusivos é seu uso tanto em salas de atendimento especializado quanto nas de ensino regular: “Se ele é inclusivo, vai funcionar em ambas as salas”. Um exemplo citado é o abecedário em braile desenvolvido por ele, que pode ser utilizado por todas as crianças em processo de alfabetização para entenderem a importância do sistema. “Acho que essa é bem a característica de inclusão”, afirma.
Todos os materiais são gratuitos e estão disponíveis na internet, podendo ser baixados por qualquer pessoa. Para Renato, a democratização do acesso é o caminho para a inclusão, que muitas vezes prioriza a venda, impedindo que outras pessoas possam conhecer tais recursos.
Durante a pandemia, o professor também tem se dedicado a outros projetos, como o de desenvolvimento dos materiais, chamado con_tacto3d, divulgado na sua conta do Instagram. Ele também lançou o livro “O mundo em 3d”, sobre a temática e sua conexão com educação inclusiva.
Outra atividade ao longo do período foi a criação de uma maquete tátil com base nas ruínas Engenho dos Erasmos, em Santos. A ideia, desenvolvida em parceria com o arquiteto Maurício Montel, foi recriar esse monumento histórico, a mais antiga construção de um engenho de cana de açúcar do Brasil. A produção levou 15 meses para ser feita e é uma das poucas do país que tem o conceito de transformar o patrimônio histórico em mais do que uma maquete contemplativa.
Outros projetos inclusivos
Em dezembro deste ano, Renato espera poder comparecer ao LABICMEX – Laboratório de Inovação Cidadã México, mesmo evento realizado na Argentina em 2018. O objetivo do encontro é reunir pessoas de diversos países da América da Latina, cada uma com sua realidade de inclusão, para desenvolvimento de uma metodologia universal, no sentido de atender vários países.
A ideia do professor é levar o projeto dos recursos pedagógicos acessíveis: “É olhar para o museu, por exemplo, e perceber que a grande maioria das coisas não é acessível: uma escultura, uma obra de arte. E aí pensar quais são os caminhos que a gente pode dar acesso, como impressão 3d, audiodescrição e por aí vai”.
Um dos desejos é que o projeto “Santos às Cegas” seja desenvolvido em outras cidades. “Comecei em Santos porque moro aqui, mas já escrevi a parte metodológica. Não escolhi qualquer monumento, a bicicleta não é qualquer uma. Tem todo um desenvolvimento conceitual que eu gostaria que outras cidades adotassem, e sabemos que tem potencial e interesse para isso”, afirma.
Renato também é conhecido pelo projeto “Narrativas Invisíveis”, proposta em que mapeou, junto com uma equipe, quatro monumentos que têm relação com a cultura afro-brasileira em São Paulo e criaram réplicas em 3d. A iniciativa é novamente voltada à preservação do patrimônio histórico e acesso inclusivo à informação. Para saber mais sobre o projeto, acesse o relato de experiência que o professor fez para o portal DIVERSA.